Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho

17 jul

Este texto é fruto de um trabalho feito em 2009 para uma das disciplinas da Pós Graduação que eu cursava na época. Sem ter a pretensão de esgotar o tema, que é um dos meus preferidos, seguem algumas linhas sobre a Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho.

O Código Civil de 1916, revogado pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, tratava como sinônimos a responsabilidade civil e o ato ilícito. Significa dizer que na concepção daquele diploma toda responsabilidade civil provinha de ato ilícito, assim como todo ato ilícito gerava responsabilidade civil, nos termos de seu Art. 159.

 O Código Civil de 2002 cuidou de separar o ato ilícito da responsabilidade civil, sendo esta apenas um dos possíveis efeitos do primeiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o ato ilícito, que historicamente tinha efeitos exclusivamente indenizantes, dado o caráter estritamente patrimonial da responsabilização dele decorrente, e a responsabilidade civil são institutos bem distintos, posto que nem todo ato ilícito gera responsabilidade civil e nem toda responsabilidade civil provém de ato ilícito, podendo esta nascer de ato rigorosamente lícito. E é justamente no Direito do Trabalho que podemos colher um excelente exemplo dessa afirmação, senão vejamos. A conhecida multa de 40% do FGTS, paga ao empregado quando da dispensa sem justa causa, nada mais é que indenização decorrente do exercício regular do direito potestativo do empregador de resilir o contrato de trabalho unilateralmente.

Esta distinção, feita em sede de introdução ao tema, é importante na busca do atual sentido e conceito da responsabilidade civil. Na esteira do Código Civil de 1916, Maria Helena Diniz assim conceituava a responsabilidade civil:

“Aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou de animal sob sua guarda, ou, ainda, de simples imposição legal. A responsabilidade civil requer prejuízo a terceiro, particular ou ao Estado, de modo que a vítima poderá pedir reparação do dano, traduzida na recomposição do status quo ante ou em uma importância em dinheiro” (grifo nosso).

É nítido o já mencionado caráter patrimonial deste conceito, que baseia a responsabilidade civil na necessidade de reparar o dano.

Com a nova noção de responsabilidade civil, calcada em ideais de cunho preventivo e/ou reparatório, ocorreu sua despatrimonialização, o que acabou gerando uma evolução conceitual. Hoje, de acordo com a mais autorizada doutrina civilista, a responsabilidade civil configura um conjunto de providências tendentes a evitar que o dano ocorra ou se amplie, sem, contudo, deixar de reparar os prejuízos causados. O foco ou elemento central passa a ser a averiguação da existência do dano, e não mais a sua reparação (intimamente ligada com a noção de culpa). Assim, a responsabilidade civil pode ser encarada, atualmente, sob dois panoramas: através de uma feição preventiva, sem prejuízo da reparatória.

Ao tratar das espécies de determinado instituto, cada doutrinador costuma, ordinariamente, elaborar sua própria classificação. Adotaremos a classificação elaborada originalmente por Maria Helena Diniz, citada por João Agnaldo Donizeti Gandini e Diana Paola da Silva Salomão. Assim, temos que a responsabilidade civil:

“Quanto ao seu fato gerador, poderá ser: responsabilidade contratual (proveniente de conduta violadora de norma contratual) ou responsabilidade extracontratual ou aquiliana (resultante da violação de um dever geral de abstenção, de respeito aos direitos alheios legalmente previstos); quanto ao agente, poderá ser: responsabilidade direta (proveniente de ato do próprio responsável) ou responsabilidade indireta (provém de ato de terceiro vinculado ao agente ou de fato de animal ou coisa inanimada sob sua guarda); quanto ao seu fundamento, poderá ser: responsabilidade subjetiva (presente sempre o pressuposto culpa ou dolo) ou responsabilidade objetiva (não há a necessidade da prova da culpa, bastando a existência do dano, da conduta e do nexo causal entre o prejuízo sofrido e a ação do agente)” (grifo nosso).

 É óbvio que na seara trabalhista, em que se pode observar uma infinidade de condutas, devido à complexidade das relações humanas, a responsabilidade civil é capaz de gerar diversas implicações. Questiona-se, nesta oportunidade, sobre o enquadramento explícito do Direito do Trabalho em alguma das espécies de responsabilização elencadas acima, ao que se reponde positivamente.

Ora, nada obsta que se configure responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana no âmbito da relação empregatícia. Explica, com brilhantismo singular, José Affonso Dallegrave Neto que “na esfera das relações de emprego, há certos fatos jurídicos que constituem, simultaneamente, ilícito penal, civil e trabalhista. Exemplifique-se com o exercício abusivo do direito de greve – grevista que atenta contra o patrimônio do empregador”.

Ainda segundo o autor, além da consequência trabalhista (despedida por justa causa) e do efeito criminal (imposição de sanção penal), o empregado deverá indenizar o prejuízo por ele causado ao empregador, nos termos do Art. 15 da Lei de Greve nº 7.783/89, caracterizando a reparação civil.

Do mesmo modo, nem se questione sobre a possibilidade de enquadramento do Direito do Trabalho no que diz respeito à responsabilidade civil contratual, tanto objetiva, quanto subjetiva.

A responsabilidade civil contratual pode ser facilmente visualizada, por exemplo, nos casos de calúnia praticada pelo empregador contra a figura do empregado, e o fundamento para a configuração da reparação civil, nestes casos, é o dever de boa-fé (um dos deveres anexos do contrato de trabalho e de conduta das partes contratantes).

Será subjetiva a responsabilidade civil nos casos de inexecução de cláusulas contratuais ou até mesmo de abuso de direito. De outro lado, será objetiva a responsabilidade assumida pelo empregador em decorrência dos riscos típicos da atividade econômica por ele exercida, conforme preceitua o Art. 2º da CLT, ou aqueles provenientes de riscos físicos (que podem ocasionar acidentes de trabalho ou doenças laborais) comuns à atividade que desenvolve a empresa.

Por fim, responde igualmente de maneira objetiva o empregador por ato de seu empregado que prejudicar terceiro, na execução do contrato de trabalho (Art. 933 do Código Civil).

DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: LTr, 2008. 

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. vol. 04. São Paulo: Saraiva, 1998.

GANDINI, João Agnaldo Donizeti; SALOMÃO, Diana Paola da Silva. A responsabilidade civil do Estado por conduta omissiva. Jus Navigandi. Teresina, ano 7, n. 106, 17 out. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4365&gt;. Acesso em: 22 de novembro de 2009.

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